A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, conceder um novo adiamento para que a União e a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) finalizem a regulamentação da importação de sementes e do cultivo de cannabis para fins medicinais e científicos no Brasil. O novo prazo se estende até 31 de março de 2025, ampliando por mais seis meses uma discussão que o tribunal considera complexa e de impacto estrutural.
O pedido de prorrogação foi apresentado pela Advocacia-Geral da União (AGU) no último dia de validade da data limite anterior, em 30 de setembro. O cronograma inicial previa que o trabalho deveria ter sido concluído ainda em junho. Na solicitação, a AGU argumentou que a tarefa envolve equipes multidisciplinares e interministeriais, além da etapa de validação técnica necessária para construir uma minuta de portaria que regulamente desde a importação de sementes até o cultivo, a industrialização e a comercialização de produtos à base de cannabis com baixo teor de THC.
“Questões profundas e relevantes”, diz AGU
Para justificar o atraso, a AGU destacou que o tema exige estudos amplos, padronização e análise de impacto sanitário. “São muitas as questões, profundas e tecnicamente relevantes, a serem ainda enfrentadas e superadas”, afirmou o órgão ao STJ, ressaltando que a proposta precisa garantir segurança e efetividade na aplicação da futura norma.
A relatora do processo, ministra Regina Helena Costa, reconheceu a complexidade do tema e classificou o andamento como um processo de natureza estrutural, o que demanda maior flexibilidade do Judiciário. Ela também afirmou não haver sinais de má-fé ou falta de empenho por parte do governo federal e da Anvisa.
Segundo a ministra, o fato de as equipes técnicas terem reconhecido a inviabilidade do cumprimento do prazo e apresentado um novo calendário exequível demonstra boa-fé e disposição em atender à determinação judicial.
Os demais ministros acompanharam o voto de Regina Helena Costa, em uma decisão unânime que integra um Incidente de Assunção de Competência (IAC), tipo de julgamento que cria entendimento obrigatório para outras instâncias da Justiça.
Origem da decisão sobre cannabis de baixo THC
A discussão ganhou novo fôlego após decisão do STJ, em novembro de 2024, que estabeleceu que a Lei de Drogas não se aplica a espécies de cannabis com baixos níveis de tetrahidrocanabinol (THC), substância responsável pelos efeitos psicoativos da planta.
Com esse entendimento, o tribunal autorizou uma empresa a importar sementes de variedades com baixo teor de THC e alto teor de canabidiol (CBD), composto sem efeito entorpecente e amplamente reconhecido por seu potencial terapêutico.
Entre os usos já comprovados pela comunidade científica estão tratamentos para epilepsia, esclerose múltipla e outras condições que causam convulsões e espasmos musculares.
Produção industrial poderá avançar no Brasil
Para que a decisão seja cumprida de forma segura e nacionalmente padronizada, o STJ determinou à União e à Anvisa a elaboração de normas que permitam importar, plantar, industrializar e comercializar variedades de cannabis com menos de 0,3 por cento de THC.
A regulamentação poderá viabilizar não apenas produtos medicinais, mas também o desenvolvimento de cadeias industriais ligadas ao cânhamo, cujas fibras têm aplicação em setores como o têxtil, o de construção civil e o de biocompósitos.
A expectativa é que o novo prazo permita o avanço técnico da versão final da portaria, enquanto pacientes, especialistas e empresas aguardam uma definição que pode transformar o mercado brasileiro de produtos derivados da cannabis.































































